Como não comprar uma edição de The Call of Cthulhu com essa capa?
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The Invitation of Sir Cthulhu
Published 24/02/2013 Blog Leave a CommentTags:blá, cthulhu, horror, literatura, lovecraft
O Ritual Ancestral do Estouro do Papel-Bolha
Published 19/02/2013 Ébrio Leave a CommentTags:humor, plástico-bolha, tangamandápio
Entre os muitos rituais da cultura tradicional tangamandapiana, está o famoso ritual do estouro do papel-bolha, cuja origem mitológica diz que é oriundo do tempo em que os deuses estavam se mudando de seus mundos originais para Tangamandápio, e grandes quantidades de papel-bolha foram usados para proteger objetos frágeis que vieram para os novos templos dos seus adoradores. Antropólogos, historiadores e bêbados de bar, no entanto, dizem que a real origem da prática vem do contato de Tangamandápio com povos que imigraram ilegalmente para a região séculos atrás, e trouxeram práticas semelhantes que eventualmente foram assumindo características mais adequadas à cultura local até chegar ao presente formato do ritual sagrado do estouro do papel-bolha.
Para entendermos o significado do estouro do papel-bolha na cultura tangamandapiana, precisamos examinar passo a passo como é realizado o ritual.
Primeiramente, o patriarca da família veste a sagrada vestimenta do estouro do papel-bolha, que é feita de plumas de aves-do-paraíso, e unge-se com óleo de girassóis enquanto pinta pelo corpo marcas tribais simbolizando o eterno ciclo de nascimento e morte. Durante todo esse período, os demais participantes do ritual, geralmente criados e membros mais jovens da casa, dançam ritualmente ao redor do patriarca, recitando mantras ancestrais de purificação do corpo e da alma.
Quando a primeira fase do ritual é terminada, o patriarca segura o punhal sagrado com a mão direita, e estoura a primeira bolha enquanto recita o primeiro verso da canção sagrada que conta a história da criação, destruição e recriação eternas do universo. O gesto repete-se durante os versos seguintes, e entre cada um deles os outros participantes do ritual cantam em uníssono a sílaba “ó!”, no ritmo do estouro das bolhas.
Quando o último verso da canção é recitado, o papel é passado pelo patriarca para o primeiro na ordem de importância na sua família, que estoura uma bolha e passa para o seguinte, visando assim espantar os maus-espíritos que assombram a vida familiar. Sempre que o estouro de uma bolha não faz barulho, é sinal de que uma grande calamidade está para ocorrer com aquele que a estourou, de forma que este imediatamente abandona o ritual e a casa, e dirige-se para um período de jejum purificador nas montanhas.
Por fim, quando a última bolha é estourada, aquele que a estourou se dirige ao altar dos espíritos ancestrais da família e realiza o sacrifício simbólico do porco, que, primeiro, deve ser enrolado com o papel-bolha utilizado durante o ritual.
O ritual do papel-bolha tem uma função simbólica muito importante na vida tradicional tangamandapiana. Itsuke-no-Kamiya, em seu livro Magia e Papel-Bolha (no original, Nitsu no Kai-do-Ne), afirma sem rodeios que “o homem tem dentro de sí uma ânsia de ódio e destruição”, e oferece como única esperança de contrabalanceá-la a realização do ritual do estouro do papel-bolha. Nos últimos anos, no entanto, a realização deste ritual ancestral tem se tornado cada vez mais raro entre os jovens tangamandapianos, que tem gradualmente esquecido suas antigas tradições e causado espanto e desgosto crescentes nos mais velhos.
– Vamos, preencha-me! – diz a tela em branco do computador. – Encha-me de palavras! Conte uma história! – a visão da página vazia é como uma bravata, um desafio.
Relutante, escrevo uma frase; apago, escrevo de novo, apago outra vez. Ideias nascem e abortam. Possibilidades me cercam e confundem. E pensar que há apenas alguns minutos era eu que provocava, e a desafiava a permanecer vazia! Mas nada sai da ponta dos meus dedos; o que surge se esvai antes mesmo de alcançá-los. E a tela segue em branco, vazia, como um espelho.
– Vamos, preencha-me! – grita aos meus olhos, como quem ri triunfante frente ao inimigo derrotado.
Morro um pouco
A cada dia.
Qualquer dia eu termino.
O Estilo de Vencer com as Mãos Vazias
Published 14/02/2013 Blog 1 CommentTags:artes marciais, blá, citação, japão, kendô, samurai
Diz-se que Tsukahara Bokuden Takamoto [fundador do estilo Kashima Shintō-ryū de kendō] estava em um barco no lago Biwa-ko, junto com vários outros passageiros, quando um deles passou a comentar sobre suas habilidades em alto e bom som, proclamando-se invencível.
No início, Bokuden preferiu nem prestar atenção no discurso prepotente desse passageiro. Mas depois de um bom tempo, quando notou que ele não iria parar de se orgulhar até que o barco chegasse ao seu destino, decidiu interrompê-lo:
– Eu também pratico artes marciais já faz algum tempo. Mas, ao contrário do senhor, eu não acho que seja fácil ganhar uma luta. Durante toda a minha vida, o máximo que pude fazer foi me esforçar para não perder.
Ao ouvir isso, o passageiro disse:
– O senhor fala coisas muito interessantes. Qual é o estilo do senhor?
– Oh, não é algo de que possa me orgulhar. Ele se chama Mutekatsu-ryū.
Erguendo a sobrancelha, o passageiro perguntou:
– Muito bem, o seu é o “estilo da vitória com as mãos vazias”? Então por que está carregando essas duas espadas na cintura?
– Oh, essas são as espadas que o meu espírito utiliza para cortar a arrogância e a inconveniência.
– Muito bem, mostre-me esse seu estilo. Quero ver se consegue me derrotar!
– Posso mostrar, mas aviso desde já: a espada do meu espírito é a espada para a vida, mas ela se torna a espada para a morte no momento em que enfrenta uma pessoa de má índole.
Furioso, o passageiro ordenou que o barqueiro remasse imediatamente para a margem, ao que Bokuden sugeriu:
– Creio ser melhor irmos até uma ilha no meio do lago. É melhor duelarmos sem pessoas para nos atrapalhar. Peço desculpas a todos os passageiros que estão com pressa, mas gostaria que o barqueiro nos levasse até a ilha.
Ao chegar à ilha, o passageiro pulou do barco, já com a espada desembainhada, e desafiou Bokuden:
– Muito bem, venha agora e vejamos essas suas técnicas!
– Acalme-se. O meu estilo necessita de tranqüilidade e concentração. Deixarei as espadas no barco.
E, se dirigindo ao barqueiro, disse:
– Dê-me o remo, lutarei com ele.
Dito isso, Bokuden segurou o remo. Mas, no momento em que todos imaginavam que ele iria pular para terra, ele rapidamente passou a remar, afastando o barco da ilha.
Indignado, o desafiante gritou:
– Ei! Volte aqui! Volte aqui!
Ao se afastar uma distância considerável da ilha, Bokuden calmamente abriu seu leque e disse:
– Se quiser, venha nadando até aqui. Garanto que tirarei sua vida antes que possa embarcar!
E, sorrindo, completou:
– Está vendo? Essa é a forma do Mutekatsu-ryū de vencer sem usar armas. Se quiser aprender, é só me procurar. Tenha uma boa estada na ilha!
(Retirado do livro Peregrinos do Sol – A Arte da Espada Samurai, de Luiz Kobayashi).
Esses japoneses tinham as melhores técnicas mesmo.
A Morte é Legal
Published 13/02/2013 Resenhas Leave a CommentTags:contos de fada, editora draco, emo, fantasia, fantasia urbana, indie, jim anotsu, literatura, morte, platonismo, pop, rap, rock, romance sobrenatural, surrealismo
A Morte é Legal é o segundo livro de Jim Anotsu, que, apesar do nome, é um escritor bem brasileiro. Depois da deliciosa, mas broxantemente curta, aventura de Annabel & Sarah, ele nos traz desta vez um romance sobrenatural com ares de épico juvenil, sempre nos encantando com a sua imaginação fértil e referências pop.
A história desta vez é protagonizada por Andrew Webley, um garoto apaixonado e, por isso mesmo, muito ridículo, vivendo na cidadezinha inglesa de Dresbel. As coisas começam a mudar para ele, no entanto, quando conhece uma garota estranha de mechas verdes que lhe faz uma proposta irrecusável, e ele logo descobre ser ninguém menos que Ive, a Princesa do Fim Inevitável, filha mais nova da própria Morte. Paralelamente, seguimos também a história da irmã de Andrew, Amber, e a sua busca pessoal para ganhar credibilidade nas ruas e se tornar a próxima rainha do hip hop.
Mais do que um mero romance sobrenatural, o que esta história apresenta é um conto sobre a maturidade e os sacrifícios que temos que fazer para atingi-la. Ao longo do texto, todos os protagonistas devem eventualmente passar por situações de crise, escolhas difíceis e decisões irreversíveis, do tipo que depois os moldará enquanto adultos. A intensidade com que tais situações são descritas – seja nas discussões de Andrew com o pai, as decepções de Amber com as próprias limitações, mesmo o desespero de Ive para evitar o destino que sua mãe decidiu para ela – é arrebatadora, e pode-se ver a sinceridade do autor escrevendo sobre si próprio por meio de seus personagens.
Há alguns pontos negativos, é claro, mas eu acredito que seja principalmente pela falta de um trabalho de edição mais incisivo. Não digo nem das dúzias de referências literárias e musicais que percorrem o livro – há sim um pouco de quebra de clima quando um dos personagens compara os seus sentimentos com uma música de uma banda obscura da qual você nunca ouviu falar, mas é também parte do jogo que o autor propõe, e do que torna a história tão sincera e cativante. Incomoda mais o fato de que a escrita por vezes parece crua e descuidada, com advérbios sobrando e frases que poderiam ser divididas ou reformuladas; uma revisão cuidadosa e reescrita de algumas passagens não faria mal. Mas o que mais me marcou negativamente mesmo foi a quantidade de simples erros de copidesque mesmo – coisas como artigos repetidos, frases que não terminam, o tipo de coisa que seria o papel de um editor mesmo consertar. Não é a primeira vez que destaco isso em um (bom) livro desta editora, e acho que vale o puxão de orelha para que os próximos lançamentos sejam mais cuidadosos.
Nada disso, no entanto, chega sequer perto de arranhar os méritos que o livro possui. Mesmo com as falhas apontadas, ainda temos um universo surreal delicioso que poderia estar em uma HQ do Neil Gaiman ou livro do Michael Ende, um enredo extremamente envolvente, com personagens e mesmo vilões que cativam e criam empatia com o leitor, e um final de partir o coração. É o tipo de história que dá até pena de ver ser publicada por um autor brasileiro – nada contra autores nacionais em si, mas pelo fato de que seria um verdadeiro pote de ouro nas mãos de um empresário que o vendesse a um estúdio de cinema, que facilmente o transformaria no filme do verão estrelando o Michael Cera ou coisa que o valha. Por aqui, vai precisar de um bocado de sorte para que um Jorge Furtado da vida o encontre e dê a ele o tratamento que a história merece.
Enfim, A Morte é Legal é, sim, um livro muito legal. Leiam, não vão se arrepender.
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