O fim do mundo está próximo!, anunciavam em letras garrafais os jornais, as TVs, os blogs. Não era alarme falso. Não se tratavam de profecias renascentisas, nem mitos maias, nem alinhamentos planetários milenares; apenas se sabia que ia acontecer. Era alguma coisa no ar, ou no céu, ou no corpo, como se a data já estivesse agendada há eras no nosso código genético e só agora todos se tornassem cientes da sua proximidade.
Seria numa sexta-feira – aliás, na próxima sexta-feira. Por todo o mundo empresas se apressaram em anunciar folga coletiva durante a última semana – não era como se a maioria dos funcionários fosse aparecer, de qualquer forma. Alguns, no entanto, se recusaram a ficar ociosos: sexta-feira era dia útil, ora essa, e não é por ser o último da existência que seria diferente! Muitos ainda viram as oportunidades de negócios da situação: lojas anunciavam a queima de estoque do fim do mundo, com os melhores preços de todos os tempos; cinemas escolhiam filmes clássicos para suas últimas sessões; moteis e bordeis anunciavam promoções especiais para a última noite, desde que, é claro, o pagamento fosse adiantado. E aqueles que não tinham razão para se ocupar, pois seus clientes ou chefes optaram por não trabalhar, resmungavam e reclamavam do dia escolhido. Por que não num sábado, ou num domingo? Ninguém faz nada no domingo, e ainda livraria a todos da última segunda-feira.
Nos bares do mundo, ao menos aqueles em que os garçons se dispuseram a comparecer, não havia outro tema a ser discutido.
– Acho que vai ser uma grande explosão. – dizia alguém, o copo recém esvaziado na mão.
– Não, não. Vamos todos ser engolidos por um buraco negro. – respondia outro.
– Acho que vão ser alienígenas. Ou seres de outra dimensão. – se arriscava ainda outro.
– Vocês não leram a bíblia? – mais um se pronunciava. – Vão ter anjos com cornetas anunciando na hora, tocando alguma marchinha de carnaval.
Não eram poucos também os que se queixavam da data escolhida.
– Meu filho ia nascer semana que vem!
– Justo agora que eu passei no vestibular!
– Agora que eu consegui dar uns pegas na Aninha!
– Justo quando o time estava bem no campeonato!
Clubes e danceterias organizaram as grandes Festas do Fim do Mundo, anunciando em panfletos e cartazes a melhor forma de viver os últimos momentos da existência, dançando até o fim de tudo sem se preocupar com a ressaca no dia seguinte. As filas para entrar eram intermináveis; todas as casas estavam cheias e movimentadas, a lotação esgotando muito antes das últimas horas, e aqueles lá dentro dançando, falando, bebendo. Aproveitavam para satisfazer seus últimos e mais secretos desejos: em um canto uma mulher era agarrada por três homens, e em outro dois primos beijavam-se ardentemente; um pai embebedava a filha adolescente, enquanto ao lado a mãe apalpava e se esfregava no cunhado. Drogas, bebidas, jogos eletrônicos – tudo acontecia ao mesmo tempo, no mesmo lugar. Até que uma voz nos alto-falantes pediu a atenção de todos, que pararam para ouvir o anúncio de que a hora afinal chegava. E contaram, todos juntos, os últimos segundos:
10!
9!
8!
7!
6!
5!
4!
3!
2!
1!
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