Fazia tempo que eu não parava para ler algum quadrinho Disney, que tanto marcaram a minha infância com os clássicos de Carl Barks e Don Rosa. Mas aí, passando na banca de revistas de uma livraria, vi a capa deste número da revista do Tio Patinhas, folheei algumas páginas e não resisti.
A edição é toda dedicada a uma versão do clássico Moby Dick, de Herman Melville, estrelada pelos patos clássicos do universo Disney: Donald como o marujo Ismael, o próprio Tio Patinhas como o capitão Quakhab, e mesmo Huguinho, Zezinho e Luisinho como uma versão tripartite do arpoeiro Queequeg. No roteiro, Dona– digo, Ismael embarca em um navio baleeiro pelo seu desejo de voltar ao mar, e logo descobre que se meteu em uma bela fria: o capitão do navio é obcecado por encontrar uma baleia cachalote chamada Moby Dick, ou “a baleia banco,” que no passado teria lhe tirado o seu bem mais precioso – não, apesar do toco de madeira que usa para substituí-la, não é a sua perna, mas algo que qualquer um que tenha crescido assistindo DuckTales é capaz de adivinhar.
Há, é claro, uma boa dose de adaptações e mudanças do texto original. Além da própria motivação de Quakhab, que aqui é mais do que uma mera vingança pessoal, há diversas inclusões do universo dos patos nos personagens, inclusive a participação de uma certa antagonista clássica do Tio Patinhas. No entanto, há também uma tentativa bem clara de se manter fiel e fazer referência à obra, seguindo as suas tramas principais, e mesmo com citações diretas de passagens clássicas. No final da revista, há ainda uma sessão especial sobre as origens da história e outras baleias famosas da literatura e cultura popular.
A arte é um destaque à parte, com um traço e cores muito bem feitos. Em especial, a caracterização de Patinhas como Quakhab ficou muito boa, cheio de trejeitos e gestos exagerados. Fosse um ator, mereceria uma indicação ao Oscar.
Claro, há de se destacar que é um quadrinho Disney, um dos símbolos da cultura norte-americana, então há toda uma bagagem política e social que não pode ficar sem comentário. Não vou ser anal-retentivo a ponto de dizer que ela é uma clara tentativa de impor a ideologia capitalista nas mentes puras das nossas crianças inocentes, mas é difícil não notar que há uma certa ponta de preconceito na caracterização de personagens não-patos-brancos-anglo-saxões. Há o jeito de falar dos sobrinhos-Queequeg, repleto dos clichês linguísticos de povos primitivos, e também um certo ataque de piratas corvos, a ave tradicional de personagens afro-descendentes no universo Disney. Não prejudica a leitura de quem quer apenas uma versão alternativa de uma obra clássica, mas está lá para quem quiser ser paranóico.
Na soma total, gostei da história, achei divertida e uma forma bacana de introduzir jovens a um clássico da literatura universal. E, claro, com preço de gibi, o que sempre é um alívio para o bolso.
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