Uma casa dá a idosos a oportunidade de dormir com belas jovens mantidas inconscientes pelo uso de narcóticos pesados. O amor que oferece em seus serviços, no entanto, não é o carnal, mas o platônico; as moças não estão lá para serem usadas fisicamente, mas para darem algum conforto às almas atormentadas pelo medo da decrepitude e da morte.
Essa é a premissa de A Casa das Belas Adormecidas, do ganhador do Nobel de literatura Yasunari Kawabata. Em um texto curto e objetivo, com apenas algo mais do que cem páginas, ele faz uma ode à pureza da beleza feminina, e também um estudo psicológico sobre a sexualidade na velhice e o medo crescente da morte conforme os anos avançam. Eguchi, o protagonista, é indicado à casa por um amigo que a frequenta, e logo entende o que tanto atrai seus amigos idosos a ela; mas ele próprio ainda se considera longe da decrepitude, e até desdenha dessa fragilidade naqueles que conhece. O contato com as garotas, no entanto, e o olhar atencioso que tem sobre elas, o fazem relembrar eventos e mulheres do passado, e acabam tendo sobre ele um efeito inesperado. Se mais de uma vez ele chega a pensar em quebrar os protocolos da casa – e não por mero desejo, mas por sentir-se inseguro com a própria virilidade, a ponto de precisar provar a si mesmo ser diferente dos outros clientes -, este ímpeto logo se esvai ao olhar para elas, frágeis e adormecidas, o que termina por domá-lo por completo.
O final do livro talvez pareça um pouco súbito e abrupto, mas é um pouco também do que o torna tão intenso. Como diz aquele velho clichê sobre orientalismos, aqui o meio é mais importante do que o fim, e o caminho mais importante do que o destino. A prosa de Kawabata é daquelas que o envolvem e enredam, enquanto ele descreve os corpos das belas adormecidas nos mínimos detalhes, e as sensações e sentimentos do velho Eguchi ao vê-las. Aos poucos você se depara com frases fortes, aquelas que rondam o seu pensamento após lê-las, e prendem-se na sua memória como verdadeiros memes; como por mais desumano que seja o mundo, ele pode tornar-se humano pelo hábito. Todas as depravações dissimulam-se na escuridão do mundo; ou aos velhos, a morte, aos jovens, o amor; a morte, uma única vez, o amor, infinitas vezes. Acabar da forma que acaba, sem se preocupar demais em resolver enredos ou fechar de tramas (que, em realidade, ele nem estava preocupado em criar em primeiro lugar), faz com que ele fique com você após a leitura, e tenha um efeito duradouro sobre os seus sentimentos.
É, enfim, um livro a se ler pelo prazer da leitura, e não por aquele ímpeto meio neurótico de chegar ao fim da história que tanto parece existir por aí. Recomendo bastante.
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