Que 3D&T seja o sistema genérico para todas as coisas nipônicas não é exatamente novidade. Ao longo da sua história ele já serviu para todo tipo de adaptação, desde animes e mangás até séries tokusatsu, passando ainda por videogames como Final Fantasy e Chrono Trigger, entre outros. Procure pela net e você vai encontrar até uma velha adaptação 3D&T Hentai, dos tempos da saudosa 3D&T Underground.
Nada mais justo, portanto, que ele seja ideal para uma adaptação de certos filmes marcados pelos litros de sangue falso jorrando pela tela e as tripas sendo arrancadas inteiras do corpo dos personagens. Falo de produções como The Machine Girl, Tokyo Gore Police, Vampire Girl vs Frankenstein Girl ou o cult do YouTube RoboGeisha – o legítimo cinema trash japonês!
Gore!
Em uma tradução grosseira, podemos dizer que gore significa sangue. Filmes classificados com este nome, portanto, são aqueles que possuem muito sangue na tela, geralmente espirrando em grandes jatos contra o rosto dos personagens. Enquadram-se no gênero desde alguns filmes de samurai antigos, também conhecidos como chanbara, até os filmes de terror de baixo orçamento, também chamados de splatter.
E juntando-se os dois grupos, temos o gore japonês. São filmes de orçamento limitado, mas que nem por isso deixam de ser cuidadosos no figurino e fotografia; possuem todos os monstros de borracha e fetiches dos filmes de terror ocidentais, mas revestidos de uma roupagem nipônica, repleto de simbolismos e personagens típicos.
Existem, enfim, quatro regrinhas básicas pelas quais você pode se guiar se quiser jogar uma verdadeira aventura de gore japonês:
1. Gore significa sangue. Eu sei que já disse isso antes, mas é bom lembrar. Isso vale para qualquer filme gore / splatter: nenhum golpe é um simples golpe, nenhum corte é um simples corte. Há sempre litros de sangue falso voando sobre a tela, enquanto membros são decepados, cabeças são explodidas e tripas são arrancadas. Em jogo, portanto, seja sempre o mais descritivo que conseguir; nunca diga eu ataco ele, mas sim eu invisto contra ele com minha katana, desviando do seu golpe e cortando-o verticalmente pelas costas, fazendo jorrar um jato de sangue que pinta o meu rosto de vermelho. Mestres que queiram ser generosos poderiam inclusive recompensar jogadores que adicionem detalhes interessantes, fornecendo bônus por descrições criativas como no Wushu – The Ancient Art of Action Roleplaying.
2. Anime é a linguagem do futuro. Alguns diriam do presente, mas o futuro sempre fica mais bonito em uma frase de efeito. Isso é algo visível em filmes como Tokyo Gore Police e Vampire Girl vs. Frankenstein Girl (este último, inclusive, adaptado de um mangá): os códigos visuais presentes são em sua grande maioria derivados de animes/mangás, com personagens típicos – principalmente samurais, ninjas e colegiais -, todos repletos de pose e frases de efeito, além de montagens e enquadramentos de cenas que poderiam ter sido boladas por um aprendiz de mangaka. Portanto, não tenha pudores em se inspirar em séries shonen ou seinen, em especial aquelas mais violentas e sangrentas – na verdade, um filme gore japonês poderia ser bem descrito como o que aconteceria se um mangá como Bersek fosse filmado com atores reais…
3. Japoneses são tarados. Isso também valeria para qualquer filme do gênero, e não só os japoneses. Nada descreve melhor um filme de terror de baixo orçamento do que uma moça siliconada correndo em trajes rasgados e gritando de horror a cada monstro de borracha que encontra no caminho. Mas os japoneses, como de praxe, conseguem elevar esse elemento a um outro nível, trazendo consigo todo um conjunto de fetiches próprios; todos os seus filmes são repleto de colegiais, gueixas e lolitas de forma geral, muitas vezes adolescentes. Na verdade, se você quiser entrar no espírito pra valer, seria interessante mesmo que os jogadores fossem incentivados a jogar com personagens femininas: a maioria das produções do gênero possui mulheres nos papéis principais, de gueixas robôs a colegiais treinadas em artes marciais, enfrentando todos aqueles ninjas e monstros. Pense em uma sessão de Mulheres Machonas Armadas até os Dentes, mas um pouco menos machonas e com katanas ao invés de metralhadoras.
4. Japoneses são doentes. Sim, eles são, e filmes deste tipo são a grande prova. Jatos ácidos disparados dos mamilos? Tem. Membros, er, “íntimos” de aparência monstruosa? Tem. Intestinos arrancados inteiros e usados como correntes? Tem. Pernas que viram hélices, seios que viram bombas, ossos que viram armas? Têm, todos eles. Em outras palavras, desligue o seu senso de ridículo: nada é absurdo, doentio ou idiota demais para um filme trash japonês.
Membros Decepados
Terminadas as recomendações iniciais, entremos na parte mecânica. Uma das grandes marcas do cinema gore – e nos filmes japoneses em especial – é a quantidade absurda de membros decepados, geralmente criando um grande chafariz de sangue falso sobre a tela. Em alguns filmes até um simples descuido ao usar um estilete pode resultar em uma amputação! Para simular isso em jogo, podemos adaptar uma regra opcional que eu fiz originalmente pro meu artigo sobre mechas pra Iniciativa 3D&T Alpha.
Basicamente, sempre que um personagem for atingido por um acerto crítico, além do dano maior, ele deve fazer um teste de Armadura. Com sucesso, nada acontece; em caso de falha, no entanto, terá um dos seus membros amputados, que pode ser escolhido pelo mestre ou rolado em um dado segundo os resultados abaixo.
1) Pernas. Perder uma das pernas causa um redutor permanente de H-2, além de dificultar a movimentação do personagem – ele só poderá realizar uma ação ou movimento na rodada, não as duas coisas. Caso este resultado seja rolado novamente o personagem perde a segunda perna, o que reduz a sua Habilidade automaticamente para 0 em tudo o que for relacionado à movimentação e mobilidade.
2-3) Braços. Perder um braço causa um redutor permanente de -2 em Força e Poder de Fogo, ou em Armadura; perder o outro braço causa o mesmo redutor, mas na outra característica.
4-5) Torso. Não é possível realmente amputar o torso do personagem (o que seria equivalente a perder as duas pernas), mas ele ainda pode ser dilarecado, esmagado ou explodido de diversas formas. Isso não modifica as características do personagem, mas causa um dano muito maior: todo o valor que ultrapassou a FD no ataque deve ser dobrado. Por exemplo, em uma FA 14 contra FD 8, o dano final seria de 12 pontos, e não apenas 6.
6) Cabeça. Morte instantânea, em uma grande chuva de sangue.
Todos estes resultados, é claro, assumem um personagem humano ou semi-humano, com um formato pelo menos levemente humanóide. Para personagens com formas diferentes (um centauro, por exemplo), o mestre deve estabelecer os modificadores que cada parte perdida poderiam causar. Também não é necessário que a arma usada seja de dano cortante – embora seja muito mais estiloso decepar um braço usando uma katana afiada, você também pode esmigalhar os seus ossos com um martelo, perfurar as suas artérias com uma lança, explodi-lo com uma granada, etc.
Um personagem também pode tentar mirar em uma parte específica do corpo do adversário para amputá-la. Fazer isso requer um teste de Força ou Poder de Fogo e, em caso de sucesso, o alvo deve fazer um teste de Armadura para não perder a parte correspondente. Em caso de falha, no entanto, nenhum dano é causado. O mestre pode impor redutores para acertar algumas partes, em especial para evitar jogadores espertinhos que queiram tentar um headshot a cada rodada.
Alternativamente, o mestre também pode determinar que não apenas acertos críticos, mas qualquer dano recebido pelo personagem força um teste de Armadura para não perder uma parte do corpo. Isso vai resultar em jogos muito mais sangrentos e violentos, além de jogadores que nunca mais vão subestimar a importância de ter uma Armadura alta…
Normalmente amputações são permanentes – você não pode simplesmente comprar um novo braço para substituir o que perdeu. Em um filme trash de fantasia ou ficção científica, no entanto, isso não costuma ser problema: sempre há um cientista louco, laboratório de clonagem ou entidade sobrenatural que pode recuperá-lo para você, geralmente incluindo alguns aprimoramentos no pacote. Assim, o mestre pode determinar que é possível recuperar um membro perdido pelo personagem, desde que o jogador pague uma quantidade de PEs igual à metade dos pontos que perdeu. Por exemplo, para recuperar um braço cuja perda impôs um redutor de -2 em Força (o que equivale a 20 PEs), o jogador precisaria pagar 10 PEs; ou então, para ressucitar um personagem de 12 pontos morto, basta pagar a bagatela de 60 PEs.
Chuvas de Sangue
Nunca custa lembrar que gore significa sangue. Uma morte em um filme assim nunca é um acontecimento simples, uma bala que atravessou o coração ou um lutador que caiu de forma limpa após apanhar demais. Há sempre uma cabeça explodindo, ou um coração arrancado ainda batendo do peito adversário, ou simplesmente uma chuva de sangue generalizada.
Não há propriamente uma regra de jogo capaz de simular isso, exceto incentivar os jogadores a descreverem as mortes do adversário da maneira mais sangrenta e absurda que conseguirem. Assim, sempre que um inimigo tiver os seus PVs reduzidos a 0, o jogador cujo personagem deu o último golpe pode pedir para descrevê-lo, adicionando todo tipo de detalhe violento e bizarro que conseguir inventar (lembre-se da dica número 4 mais acima). Após a descrição, ele deve fazer um teste de Força ou Poder de Fogo, conforme foi o atributo utilizado no último golpe: com sucesso a morte aconteceu exatamente como descrito, e o personagem ganha 1 PE de bônus na hora; em caso de falha o inimigo ainda morre, mas de uma forma um pouco menos impressionante.
Se quiser, é claro, e especialmente se a descrição do jogador for criativa e divertida, o mestre pode eliminar o teste e dizer que a morte simplesmente aconteceu daquela forma, dando o ponto de bônus automaticamente. Não é necessário ser muito controlado nesse quesito, nem ficar receoso de distribuir muitos PEs durante a aventura – eles provavelmente serão gastos para recuperar os membros amputados dos personagens de qualquer forma…
Comentários